Monumento, Douglas de Freitas
[Galeria Athena Contemporânea, Rio de Janeiro, 2016]

A ideia da perda de sentido na presença de monumentos no mundo
contemporâneo, da falência dessa construção escultórica
de representação histórica e cultural na paisagem da cidade, parece guiar
a produção de Vanderlei Lopes em busca de um novo modelo possível.
Deste modo, o artista opera na construção de monumentos às avessas,
ou monumentos mínimos, onde transitoriedade e fixação – coincidência
ou não, embate vivido também nas cidades contemporâneas – entram
em choque. Os grandes heróis estão em queda, e dão lugar a
fugacidade dos novos tempos.
O monumental no trabalho de Vanderlei extrapola o significado
restrito à tradição escultórica e arquitetônica, engloba também os
símbolos por nós eleitos como grandiosos na cultura, por valor cultural,
religioso, monetário, e é claro, por valor especulativo.
Seus monumentos elevam o banal, o acidente, a perda. Trazem à luz o que
passa desapercebido, constroem buracos e tropeços, fazem desconfiar
das certezas. É o milagre da conversão das pequenas coisas
mundanas em grandiosas, onde não é mais a escala desses elementos
que conferem à eles significância e sim as ações que eles contém,
neles perpetuadas. Vincar, dobrar, queimar, derramar, marcar, cavar e
tantos outros atos de caráter efêmeros são eternizados pelo artista,
através da conversão da matéria e da sobreposição de espaços e
tempos distintos. Um cavalo em tamanho real congelado no instante
fotográfico entre tombar e reerguer, e a marca de suor de um copo
transmutado em metal sólido sobre a mesa, carregam em si o mesmo
milagre presentificado, pouco importa a escala.
O monumento apresentado é incerteza certeira, é a constante
sensação de que algo está oculto, que tudo está velado, mesmo que
ainda se faça presente. Os trabalhos são fantasmas carregados de
matéria, são imagens efêmeras elevadas a objetos repletos de corpo.
Prestes a inaugurar ou exibir, em Monumento nada é exibido a não ser
seu próprio tecido sudário. O que deveria proteger esse objeto de
grande importância de olhares prévios à sua inauguração, ou de algum
possível dano causado por um espaço ainda em obras, agora está ali,
ele próprio convertido em monumento, ocultando permanentemente o
objeto que deveria proteger, se tornando ele mesmo o objeto.
A preciosidade do que deveria estar por baixo, se deixa ver apenas por
frestas laterais, por onde a luz dourada do avesso escapa, vestígio da
importância do que está ali oculto. Resta apenas olhar a trivialidade
com que o caimento e os vincos destes tecidos desenham, e que agora
são perenes. Eles sim são a grandiosidade que se projeta
delicadamente diante de nós.
Em Projeto a tentativa construtiva está falha, amassada, e é ela
mesma a construção final. Está consolidada em milagre oculto, onde,
diante dos olhos, papel marcado se torna marca dele mesmo,
parece ter sido engolido por sua própria imagem e solidificado. E no impasse
de estar certo ou errado, se eterniza em trânsito, entre geometria
compulsiva de dobras, e ação destrutiva hesitante, paralisada antes do
fim previsto.
A desconstrução total se torna o próprio projeto, e o desenho que
deveria sustenta-lo, ou um dia já sustentou. Eles sim se consolidam
como monumentais. Ode à falha como processo e objetivo final da
construção, são refugos eternizados, são eles mesmos os monumentos
erigidos por Vanderlei Lopes. Nenhuma certeza está revelada.
Errância e engano importam mais que qualquer verdade absoluta.